Ainda Estou Aqui: Relembre a trajetória do filme que está renovando o passado
Em um país que as cicatrizes da ditadura militar nunca foram curadas, “Ainda Estou Aqui” reacendeu os debates e trouxe o passado à tona.
Texto por: Lucas Cardamone e Mariana Marsicano
Dirigido por Walter Salles, o filme adaptado do livro de mesmo nome do autor Marcelo Rubens Paiva, narra a história da dolorosa memória da sua família do escritor após o desaparecimento do próprio pai, ex-deputado Rubens Paiva, em 1971. No filme, a mais aclamada, Fernanda Torres interpreta a mãe Eunice Paiva, que enfrenta o regime opressor e busca respostas sobre o paradeiro de seu marido.
Desde o lançamento, o filme atraiu quase 3 milhões de espectadores no Brasil, tornando-se o filme nacional com maior sucesso de bilheteria desde a pandemia. “Ainda Estou Aqui” recebeu 3 indicações à disputa do Oscar: Melhor filme, Melhor filme internacional e Melhor atriz, destacando não apenas a qualidade do filme, mas também da cultura brasileira.

Créditos – Reprodução:@trigonoproduções
O lançamento coincidiu com um período de instabilidade do país, se encaixando perfeitamente com o filme, incluindo tentativas de golpe e debates políticos acalorados sobre direitos e democracia, transformando o filme em exemplo.
O impacto da obra chegou a Brasília, gerando intensos debates dentro do Congresso. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mencionou o filme em discursos oficiais, destacando a importância da memória histórica para a defesa da democracia. Parlamentares da base governista, como Erika Hilton, usaram a repercussão para reforçar a necessidade de fortalecer políticas de reparação às vítimas da ditadura e defender a reabertura de investigações sobre os crimes cometidos pelo regime. Por outro lado, setores mais conservadores criticaram a produção, alegando que reacender esse passado poderia alimentar divisões no país. A comoção popular gerada no país levou a manifestações públicas e pedidos para que o governo ampliasse a atuação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, trazendo uma conversa há muito adormecida nos corredores do Poder.
“Ainda Estou Aqui” não é apenas uma obra cinematográfica; é um convite à reflexão sobre os desafios atuais que a democracia está enfrentando. Ao trazer à tona atrocidades vividas na época da ditadura e as histórias de resistência, com atuações esplêndidas, ele nos lembra a importância de confrontar os traumas que foram estrangulados e construir um futuro mais justo, afinal como o próprio Marcelo disse, a luta por direitos humanos e pela verdade histórica é contínua e essencial para a saúde de qualquer nação.
Em tempos de polos e desafios, “Ainda Estou Aqui” vira lembrete de que para avançar, é fundamental lembrar e aprender.
“Aqueles que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo” – George Santayana
Ainda estou aqui no mundo das premiações:
O filme inspirado no livro de Marcelo Rubens Paiva foi um sucesso desde sua estreia, quando foi exibido no Festival Internacional de Veneza. A exibição conquistou o público que assistiu a obra, que gerou aplausos durante mais de 10 minutos e fez o filme conquistar o prêmio de melhor roteiro no Leão de Ouro, premiação do festival italiano.
Outra barreira a ser quebrada desacreditada por muitos foi a coroação de Fernanda Torres como melhor atriz no Globo de Ouro 2025. A atriz desbancou outras mulheres consideradas de grande nome no cinema mundial, como Demi Moore (A substância) e Angelina Jolie (Maria). Confira o discurso na íntegra:
“Meu Deus, eu não preparei nada porque já estava satisfeita. Esse foi um ano incrível para as atuações femininas. Tantas atrizes aqui que eu admiro tanto.
E, claro, eu quero agradecer a você, Walter Salles, meu parceiro, meu amigo. Que história, Walter! E, é claro, eu quero dedicar esse prêmio à minha mãe. Vocês não têm ideia. Ela esteve aqui há 25 anos. E isso é uma prova que a arte pode durar pela vida, até durante momentos difíceis, como esta incrível Eunice Paiva, que eu fiz, passou.
E a mesma coisa que está acontecendo agora, em um mundo com tanto medo. E este filme nos ajuda a pensar em como sobreviver em momentos duros como este.
Então, à minha mãe, à minha família, para o Andrucha [Waddington, marido de Fernanda], para o Selton [Mello], meus filhos, a todos. Muito obrigada ao Globo de Ouro, Michael Barker, Mara, tantas pessoas. Muito obrigada!”
Não são só os cinéfilos que gostaram de Ainda Estou Aqui. De acordo com dados do Box Office Mojo, o filme brasileiro registrou mais de US$ 27,4 milhões em bilheteria no mundo, cerca de 160 milhões de reais. A produção já é ao menos a quinta produção nacional com maior arrecadação no planeta. Esses números tornam Ainda Estou Aqui o filme de maior bilheteria entre os que concorreram ao Oscar de Melhor Filme Internacional. As bilheterias deram um resultado satisfatório financeiramente, mas também trouxeram principalmente visibilidade à obra, acontecimento essencial para a disputa nas premiações. A obra dirigida por Walter Salles foi a segunda mais bem avaliada no aplicativo Letterbox em 2024.
O grande dia do Oscar
Finalmente, no dia 2 de Março de 2025, “Ainda Estou Aqui” fez parte da cerimônia do Oscar. A obra foi o filme brasileiro com mais indicações na história, sendo elas: Melhor Filme, Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz (Fernanda Torres). A atriz que interpreta Eunice Paiva fez questão de ressaltar algumas vezes que estar na premiação já era uma vitória. “Quando um ator brasileiro, falando português, é nomeado, ele já ganhou. Pode estourar champanhe, entendeu? Vai para lá sem expectativa, porque não vai levar”.
Apesar das falas, a expectativa se manteve grande entre os brasileiros que lidam a premiação como uma final de Copa do Mundo. O filme conquistou o Oscar de Melhor Filme Internacional Este foi o primeiro troféu do Oscar na história que veio ao Brasil.