A exaustão física e psicológica de atletas de alto rendimento

A exaustão física e psicológica de atletas de alto rendimento

Com o aumento dos jogos e torneios, muitas vezes não é levado em consideração o preparo físico e psicológico das peças chaves de qualquer jogo: os próprios jogadores.

Texto por Lucas Cardamone

O futebol mundial vem crescendo em números de partidas e torneios, quase exigindo que os clubes tenham, além de onze titulares, um elenco recheado de jogadores para que seja possível disputar todos os campeonatos em grande nível. A inserção do novo campeonato mundial da FIFA, que ocorrerá de 4 em 4 anos e contará com 32 times e a remodelagem da Champions League que foi de 96 partidas antes do mata-mata para 144, servem como exemplo.

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Com o aumento de partidas, jogadores como Heung-min Son do Tottenham e técnicos como Carlo Ancelotti do Real Madrid vieram a público em desaprovação à quantidade de jogos. O ex-jogador e membro do conselho de supervisão do Bayern de Munique Karl-Heinz Rummenigge não concorda com seus parceiros de profissão, dizendo à revista Kicker que o aumento do número de jogos no calendário se deve aos salários cada vez mais elevados pedidos pelos futebolistas que obrigam o clube a buscar novas fontes de receita.

Em entrevista à Revista Vulpes o jornalista da TNT SPORTS Gabriel Simões afirma que “O excesso de jogos prejudica [na qualidade do futebol jogado]. Acho que não existem técnicos e jogadores de primeira prateleira que discordam. É uma mostra clara de que a grande preocupação de quem manda no futebol não é exatamente a qualidade do produto ou do esporte, mas sim no que vai dar mais dinheiro”.

O CORPO DO ATLETA:

Para o atleta, o corpo vai além de estética ou saúde, ele é sua principal ferramenta de trabalho. São vários os casos de jogadores que acabaram encerrando a carreira antes do esperado por complicações físicas, por isso portanto é sempre crucial o jogador se atentar ao risco de lesões e as demandas do corpo.

Para o fisioterapeuta do esporte Guilherme Donaire Sertorio, os desgastes físicos do atleta podem ocorrer por diversos motivos. “É muito treino, é muito jogo, mas também é muita viagem. Acaba atrapalhando na parte de recuperação. Hoje o cara joga no sul, chovendo e frio. Amanhã ele está no Nordeste contra um Bahia. Sol, temperatura seca, tempo de voo, diferença de clima… Tudo acaba prejudicando”. Guilherme sorri ao dizer que hoje, a fisioterapia entra mais como uma forma de prevenção do que recuperação e, de acordo com ele, sua especialidade previne de 50% a 70% das lesões do atleta.

Mesmo com os avanços da medicina e fisioterapia, os números de lesionados são impactantes. De acordo com levantamentos realizados pelo ge, até a 25ª rodada da atual edição do Campeonato Brasileiro houve cerca de 565 problemas físicos envolvendo atletas da competição.

Ao ser perguntado sobre a influência do psicológico no corpo, o fisioterapeuta fez questão de ressaltar uma grande relação que os envolvem: “Uma coisa está totalmente vinculada à outra, é uma engrenagem. A partir do momento que você não tá feliz em casa ou não tá feliz no trabalho, as coisas começam a desengrenar. Se você tem alguma peça que tá desencaixada, o negócio não vai rodar do jeito certo”.

A CABEÇA DO ATLETA:

O ritmo intenso de partidas não interfere apenas no físico dos atletas. O psicológico – fator que tem extrema importância dentro e fora das 4 linhas do campo – pode facilmente ser prejudicado com a alta demanda de jogos.

A psicóloga do esporte Marisa Markunas ressalta que: “Para alta performance você precisa ter muito equilíbrio emocional para poder ter simultaneamente, um foco mental e um foco cognitivo. Seja ao realizar as ações esportivas ou se manter competitivo.” Com o passar do tempo a quantidade de jogadores que vem a público falar sobre a importância da saúde mental vem aumentando. Um caso que alcançou grande repercussão foi o de Adriano Imperador. O ex-atleta teve uma grande queda de rendimento devido a uma depressão que foi provocada em 2004, após a morte do próprio pai. Na biografia “Adriano – meu medo maior”, escrito pelo jornalista Ulisses Neto, o “Imperador” conta que: “Muita gente usa o futebol como válvula de escape, eu precisava de um escape do futebol. Esse escape era a minha família. Meu pai. Quando olhei, ele não estava mais ali. Uma coisa levou a outra, e a bebida se tornou a minha companheira”. Adriano superou a depressão ao voltar para sua comunidade no Rio de Janeiro e ressalta a importância dos amigos e família no momento mais difícil de sua vida. 

O atual jogador do Fluminense, John Arias, protagonizou uma cena emblemática na comemoração da conquista da Libertadores em 2023. Após o apito final do árbitro na partida contra o Boca Juniors o colombiano deu um grande abraço em Emily Gonçalves, psicóloga que trabalha na equipe carioca desde 2007.

John Arias abraçando a psicóloga do fluminense após conquistarem a América – Créditos: Reprodução / FluTv

O IMPACTO DAS REDES SOCIAIS

No Instagram, a pessoa mais seguida do mundo é Cristiano Ronaldo. A segunda… Lionel Messi. O futebol é o esporte mais consumido do planeta e, como consequência, os grandes jogadores da modalidade se tornam super celebridades de forma quase inevitável. 

A psicóloga Marisa Markunas acredita que as redes sociais são como “outra realidade”, que pode ser benéfica em alguns momentos, podendo servir como descontração e socialização, mas se torna um problema se comprometer o desempenho ou distorcer a realidade do atleta.

“Você não é aquilo. Você é uma pessoa que se relaciona com outras pessoas no seu mundo real, são essas pessoas que vão te abraçar quando você sofrer uma lesão grave, que vão te cobrar e te incentivar quando você precisar de outro foco.” disse a psicóloga e completou “Os caras da rede social vão bater palma quando você fizer gol e vão te xingar quando você perder um gol. E você vai ter que dormir com esse barulho, com a ilusão de que você é uma estrela ou com a dor de ser o carrasco”.

Fonte: Instagram. Acesso em 27 de novembro de 2024

EXISTEM SOLUÇÕES PARA O CALENDÁRIO EXAUSTIVO?

A premissa de diminuir o calendário pode soar como algo simples, que rapidamente será alterado e, talvez, de fato seja assim, mas a quem isso beneficiaria?

Hoje, no Brasil, são destinadas 16 datas para a realização do campeonato estadual. Enquanto isso, para ser o vencedor da Libertadores da América são necessárias 13 partidas. Esses números são considerados desproporcionais para muitos quando colocado o nível de relevância e as receitas que os campeonatos acumulam. Quem organiza o campeonato estadual são as federações de cada estado, as mesmas que elegem o presidente da CBF, entidade responsável por estabelecer as datas para cada torneio.

O jornalista Gabriel Simões ressalta o fato de vivermos numa sociedade capitalista e que o futebol é só mais uma das coisas afetadas por isso, priorizando o mercado e não a qualidade do jogo ou da saúde dos atletas. O jornalista também aponta uma possível solução para a melhora desse e de outros aspectos a nível nacional “São os clubes que trazem o público, são os clubes que trazem a demanda, então eles tem o poder. Por mais que hoje eles não tenham o poder político da coisa, eles tem o poder de grandeza, de tamanho, para se juntar e escolher coisas que são melhores para o bem geral do futebol brasileiro. Só que esse é o grande problema: nenhum clube está preocupado de fato com o bem geral dos brasileiros, só com seus próprios interesses”.

Atual presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues – créditos: Rodrigo Ferreira/CBF

EDITADO POR LUCAS GINES E MARIANA LUMY

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