A crescente das apostas esportivas no Brasil e o impacto na sociedade

Crescimento do mercado de apostas esportivas no Brasil

Entenda como o alto número de apostadores e publicidades de bets podem impactar no cotidiano do brasileiro

Texto por Lucas Cardamone

Em um país como o Brasil onde o futebol é aclamado e está presente no cotidiano da população, as casas de apostas encontraram um ótimo local para ganhar influência, tornando-se parte da rotina de muitos brasileiros. A pesquisa divulgada no dia 1 de outubro de 2024 pelo Instituto DataSenado aponta que cerca de 20,3 milhões de pessoas com mais de 16 anos já apostaram nas chamadas “bets“, o equivalente a 13% da população do país com essa faixa de idade. Cada vez mais popular, esse mercado tem atraído apostadores de diversos perfis, que buscam entretenimento ou possibilidade de lucro. Essas casas de apostas, porém, impactam de forma negativa na vida de muitos dos apostadores.

Em estimativa publicada pela CNN em junho de 2024, o setor de apostas movimenta de R$100 a 120 bilhões por ano no Brasil, o equivalente a 1% do PIB nacional. O aumento do uso não se deve somente pelas 70 empresas operando em território nacional, uma grande quantidade mesmo após a regulamentação divulgada pelo governo federal. As inúmeras possibilidades de bets oferecidas se tornaram um grande convite para o apostador: é possível realizar apostas a partir de um real, podendo ser múltiplas, simples, qual time marca primeiro, número de escanteios e muito mais.

O vício do brasileiro nas apostas esportivas

Para a psicóloga Sandra Sousa Lima, “A aposta torna-se prejudicial quando invade outros âmbitos da vida para além do que deveria”. Apesar de “brincar” ser natural do ser humano, existem casos nos quais as apostas ultrapassam essa barreira e afetam a vida pessoal do indivíduo sem que ele perceba.

Adriano Monteiro, de 31 anos, administrador do canal “Apostador Falido”, no YouTube, já chegou a perder 170 mil reais, além de perder o emprego, devido às apostas. Monteiro vendeu sua casa e carro, se afastou de amigos e enfrentou a depressão por causa das bets. “Eu passava o dia inteiro fazendo isso. Era a rotina de trabalho chegar em casa e ficar no celular. Constantemente você vê que se isola e fica só apostando. O mundo gira em torno disso”, comentou Adriano em um de seus vídeos.

“O vício não surge do nada, ainda que todos possam ter ou criar um, há quem já possui propensão a ele. Pode ser tanto comportamental quanto de ordem biológica”, comenta a psicóloga Sousa.

A psicóloga ainda afirma que todos estão sujeitos a possibilidade de ter ou criar algum vício e que se for notada alguma compulsão na aposta a pessoa deverá tratar com ajuda profissional. Caso isso não ocorra, “esse vício apenas se desloca pra outra coisa”.

Os jogos de aposta tem um potencial viciante, que aumenta à medida que o próprio mercado incentiva a prática. “O tempo todo a pessoa é convidada ao vício, pois é um mercado muito forte que a todo momento busca te convencer a gastar mais”, diz Sousa. “Eu quero promover saúde, mas o mercado quer que uma pessoa se vicie porque ele vive disso”, completa a psicóloga que se refere a alta quantia de dinheiro investido em publicidade pelas empresas de bet. Em 2024, mais de 550 milhões de reais foram pagos apenas para clubes de futebol com a intenção de anunciar a marca.

As apostas dentro dos gramados

A indústria das apostas tem realizado um forte investimento no Brasil, buscando o espaço nos meios publicitários do futebol. Mais da metade dos clubes da primeira divisão do campeonato brasileiro contém algum patrocinador desse meio, como o Corinthians, que tem a “Esportes da Sorte” como o patrocinador principal. Esse fato proporciona maiores arrecadações e, consequentemente, mais investimentos por parte dos clubes, o que facilita na contratação de jogadores com maior nível e desequilibra o futebol brasileiro em comparação à América do Sul.

Por outro lado, o crescimento das casas de apostas influencia no fenômeno de manipulação dos resultados dentro do futebol. De acordo com o Globo Esporte, em 2023 o Brasil registrou 109 casos de jogos suspeitos de manipulação.

O caso de Alef Manga, ex-jogador do Coritiba, chamou atenção na época ao ser descoberto que ele aceitou uma proposta de R$45 mil vinda de manipuladores, em troca de receber um cartão amarelo durante uma partida. O atacante foi julgado pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e condenado a pagar uma multa de R$30 mil, além de ser punido dos gramados por 360 dias. Agora, já liberado para jogar, Alef está atuando pelo Avaí e afirmou em entrevista ao Denilson Show que companheiros do então clube do jogador também participaram do crime e saíram ilesos.

As casas de apostas são legalizadas no Brasil?

O mercado de apostas passou a ser legal no Brasil em 2018, após a sanção do então presidente Michel Temer. Segundo o portal Gov.br, os tributos gerados para o país são destinados a áreas como saúde, educação e segurança pública.

A mais recente mudança na lei que envolve a operação das bets no país ocorreu na virada de 2024 para 2025, quando a regulamentação foi oficializada pelo Ministério da Fazenda. Com a implementação de novas regras, a regularização diz buscar o aumento da segurança, combate à lavagem de dinheiro e proteger os jogadores contra o vício em jogos de azar. Algumas das principais alterações são a adoção de medidas que visam o jogo responsável ao gerar mecanismos de controle aos usuários, o aumento na tributação das plataformas legalizadas e a tentativa de conscientizar apostadores com publicidades, sendo proibido termos como “renda extra” e incentivando o autocontrole nos jogos.

Campanha de jogo responsável da casa de aposta “superbet” – Divulgação: Superbet Brasil

Desde quando existem as apostas esportivas no país?

Se engana quem pensa que as apostas esportivas são algo recente no Brasil. No começo da década de 1970, a Caixa Econômica Federal criou uma modalidade de loteria esportiva, conhecida como “Loteca”. Nela, era preciso acertar o resultado de treze jogos selecionados pela Caixa para ganhar o prêmio. Os participantes poderiam marcar duplos (vitória ou empate) ou até triplos (vitória de qualquer lado ou empate) em algumas partidas a escolha, dependendo do bilhete comprado.

Desde aquela época já haviam manipulações de resultados. O chamado caso da “Máfia da Loteria Esportiva” começou a ser investigado em 1979, quando os jornalistas da revista Placar, Milton Coelho da Graça e Juca Kfouri, começaram a investigar alguns resultados da Loteria Esportiva. Posteriormente, em 1982, Sergio Martins publicou, também na Placar, uma matéria denunciando 125 pessoas que estavam de alguma forma relacionadas com a manipulação de resultados de jogos. Dentre eles, dois campeões do mundo pela seleção Brasileira, Amarildo (1962) e Marco Antonio (1970). Depois do acontecimento, a Loteca perdeu força e nunca mais se recuperou. As bets digitais, por outro lado, continuam firmes e estão longe de acabar.

Foto da capa disponível em iStock
Editado por Mariana Lumy

Autor

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima