Como o retorno de Trump afeta as perspectivas políticas, econômicas e sociais no mundo

Como o retorno de Trump afeta as perspectivas políticas, econômicas e sociais no mundo

Após a eleição do presidente americano, o cenário global começou sentir os efeitos de ações extremistas 

Texto por Maju Blanes e Mariana Lumy

Na última segunda-feira (20), o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assumiu o cargo durante um evento no Capitólio em Washington D.C. O final de semana foi marcado por festas e comemorações em torno da vitória republicana no país. Contando com 18 bailes de gala, comícios e eventos festivos, a posse de Trump foi marcada por posturas nacionalistas e discursos que conferem o ponto de vista do presidente.

Com propostas que podem ir desde o cessar-fogo de guerras e chegar até as implementações de novas tarifas alfandegárias para outros países, o retorno de Trump evidencia o cenário internacional, que procura o fim dos conflitos bélicos, mas ao mesmo tempo a ascensão do extremismo com o retrocesso de direitos sociais e humanitários.

A segunda temporada do governo Trump foi lançada

Desde o primeiro mandato entre 2016 e 2020, as propostas do republicano Donald Trump sempre estiveram alinhadas à ideologias da extrema direita, refletidas nas propostas da campanha e nas ações do governo. A criação do muro na fronteira sul do país norte-americano, que restringe a entrada de imigrantes mexicanos no país, foi sua maior proposta durante o primeiro governo do presidente e também o principal motivo de sua eleição. Segundo dados publicados pela BBC em 2021, dos 3.142 km de extensão fronteiriça, 727 km já haviam sido construídos para impedir a passagem dos imigrantes, no entanto, somente 76 km foram construções primárias feitas no governo Trump.

Apesar das dificuldades para realizar a promessa dos 800 km de muro, as políticas de imigração foram enrijecidas cada vez mais no primeiro mandato do presidente. Não somente, o endurecimento das ideologias da direita americana se voltam para a propaganda que busca promover o slogan da vitória de Trump. “Make America Great Again” , ou “Torne a América grande novamente” na tradução em português, foi a propaganda política mais efetiva para a eleição de Trump que se inspirou no ex-presidente Ronald Reagan. Buscando demonstrar a fragilidade econômica e política no país, o atual presidente busca por propostas bem alinhadas àquelas que existiam em 2016.

Entretanto, mesmo com as medidas em relação à imigração nos Estados Unidos se manterem em pauta durante o atual mandato de Trump, as principais políticas atuais do norte-americano se diferem das anteriores em um ponto: quem é afetado. Ao contrário do primeiro governo, as novas decisões afetam também aqueles que já se encontram em solo estadunidense. A nova decisão poderá impactar 11 milhões de imigrantes ilegais ou irregulares no país.

Foto por Fibonacci Blue em commons.wikimedia.org/

Politica Internacional

Além das rigorosas medidas contra a imigração ilegal nos Estados Unidos, durante toda a campanha, Trump expressou a vontade de impedir que os conflitos armados nos territórios da Ucrânia e da Palestina continuem durante o seu governo. No dia 17 (sexta-feira), após 15 meses de insistência do governo americano, o cessar fogo entre Israel e Palestina foi aprovado pelo governo israelenese, que conseguiu resgatar 3 reféns do domínio do grupo terrorista Hamas em troca de 95 presos palestinos não envolvidos nos ataques de 8 de outubro, tudo isso apenas na primeira das três fases do acordo.

Um dos fatores chamativos deste acordo foi a entrada do mediador Steve Witkoff, enviado por Trump, que em algumas semanas conseguiu o consenso do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. De acordo com autoridades árabes não reveladas entrevistadas pela Gazeta do Povo, “Witkoff teve maior influência em apenas uma reunião com Netanyahu do que o presidente Joe Biden conseguiu em um ano”. Não bastando, as ameaças do atual presidente americano para que os reféns estivessem soltos antes do dia de sua posse também foram efetivas para a concessão da medida nos dois territórios. No dia 7 de janeiro, durante uma entrevista coletiva em sua residência na Flórida, Trump ameaçou que “o inferno vai se instaurar no Oriente Médio, e isso não será bom para o Hamas, e não será bom, francamente, para ninguém. Vai ser instaurado o caos” caso suas condições não fossem consideradas.

No mesmo cenário, o questionamento se o mesmo poderá acontecer entre Rússia e Ucrânia é inevitável. Em uma entrevista televisiva, o presidente da Ucrânia Volodymyr Zelenski declarou: “Trump pode ser decisivo. Para nós, isso é o mais importante. As qualidades dele estão de fato lá. Ele pode ser decisivo nessa guerra. Ele é capaz de parar Putin ou, para ser mais justo, nos ajudar a parar Putin. Ele é capaz de fazer isso”. A esperança da atuação do republicano no conflito foi também especulada após o discurso do dia 15, antes da cerimônia de posse. Em coletiva, Trump afirmou que, não apenas a Ucrânia, mas a Rússia também está perdendo muitos jovens e “esse é um conflito que nunca deveria ter acontecido”. O discurso do atual presidente teve resposta do presidente da Rússia, Vladimir Putin, que afirmou também estar aberto ao diálogo para a “paz duradoura baseada no respeito pelos interesses legítimos de todas as pessoas”.

Economia e Produção Industrial

Durante as promoções de sua candidatura, Donald Trump enfatizou diversas vezes o cenário econômico frágil pelo qual o país passava. Com o aumento indiscriminado no custo de vida americano, as preocupações financeiras dos cidadãos só aumentaram, o que gerou um clima decisivo para a eleição de um “novo” representante que propusesse novas medidas para a melhoria do dia a dia estadunidense.

Com a entrada do ex-presidente Biden, os preços dos produtos e dos serviços aumentaram consideravelmente. No final de 2022, o índice anual de preços americano marcou 9,1%, o maior aumento desde novembro de 1981. Desde então, a inflação veio desaquecendo e o índice conseguiu ser reduzido para 2,4%, no entanto, as perspectivas dos americanos persistem em um aumento que vai existir, mas em um ritmo menos acelerado. Para Steven Kamin, pesquisador sênior do centro de estudos da American Enterprise Institute, “o americano médio não lê as estatísticas de inflação. Ele não vai fazer uma distinção conceitual entre nível de preços e taxa de variação. O que ele sabe é que os preços no supermercado estão altos”, confirmou o pesquisador em uma entrevista com a BBC.

Mesmo com o risco contínuo de uma economia um pouco mais fragilizada, a proposta de Trump é retomar, com todas as forças, a posição no mercado mundial. Durante a campanha, o setor que ganhou maior atenção foi o secundário, o qual Trump acredita ter perdido força durante os últimos governos. Para ele, a produção industrial americana começou a ficar muito cara, o que fez com que muitas empresas levassem suas produções para países com menor custo de mão de obra, como China e México. Toda essa movimentação resultou em uma diminuição relevante no produto interno bruto dos Estados Unidos. Enquanto a indústria contava com 18,3% do PIB do país em 1988, em 2024 essa contribuição foi de apenas 10%.

Em 2005, uma pesquisa realizada pelo Censo do Trabalho na China revelou que o custo de produção no país asiático era equivalente a 0,64 dólares por hora para cada trabalhador, enquanto, no mesmo ano, o custo da mão de obra norte-americana se igualava a 21,11 dólares por hora. A diferença abrupta conseguiu que, com o passar dos anos, a produção industrial saísse das mãos dos Estados Unidos.

Clima

Não é apenas na economia que o investimento industrial pode interferir. Na posse do dia 20 de janeiro, Trump falou sobre as questões climáticas e ambientais do país e, durante o evento, assinou a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, que controla as taxas de emissão dos gases do efeito estufa em países com alta produção. É a segunda vez que o país deixa o acordo e, para o presidente, a saída pode restaurar o nível das indústrias e economizar “trilhões de dólares”. Apesar do lado industrial positivo, a ação do governo Trump é considerada imediatista e anti-clima, revogando as existentes políticas para o combate às mudanças climáticas do governo Biden.

Não somente a saída dos Estados Unidos do Acordo pode impactar o país, mas a paralisação do uso de energia eólica é outra política que afeta a questão climática. “Drill, baby, drill” foi outro slogan usado pelo republicano durante a sua campanha. A frase, que traduzida significa “Perfure, querida, perfure”, faz menção à investida para a utilização de combustíveis fósseis no país, que segundo o presidente, possui a maior abundância em produção de petróleo no mundo. Segundo estimativas, as políticas pró-combustíveis fósseis de Trump podem adicionar cerca de 4 bilhões de toneladas de emissões de carbono aos níveis norte-americanos até 2030.

Foto por Kaboompics em Pexels.com

Taxação Alfandegária e o BRICS

Ainda seguindo a ideia de reconstituir a posição de primeira economia do mundo, Donald Trump falou sobre a imposição de uma nova tarifa sobre importações de produtos no país. Para os territórios do Canadá e do México, que fazem livre comércio com a potência norte-americana, há planos para uma taxação de 25% em qualquer produto importado a partir de fevereiro. Já para a China, a taxação aumentará 10%, equivalente a 60% em cima de qualquer produto chinês.

Os três países afetados pelo aumento das taxas são atualmente os maiores parceiros comerciais dos EUA. O discurso do presidente vem da ideia de taxar estrangeiros, a fim de enriquecer a população norte-americana. “Em vez de taxar nossos cidadãos para enriquecer outros países, vamos tarifar e taxar países estrangeiros para enriquecer nossos cidadãos”, Trump afirmou na cerimônia de posse.

As novas taxas alfandegárias ameaçam o USMCA, o Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio que envolve os Estados Unidos, México e Canadá. Criado em 2018 pelo próprio Donald Trump, o USMCA substituiu o NAFTA – antigo acordo que estabelecia uma zona de livre comércio, diminuindo impostos e taxas a fim de facilitar a entrada e saída de produtos entre os países –, reformulando o acordo de libertação econômica, mas mantendo o principal: incentivar a zona de livre comércio. Com as novas taxas alfandegárias, o risco de uma guerra comercial entre os países norte-americanos aumenta.

Ainda sobre o relacionamento dos Estados Unidos com outros países, Trump deu uma declaração na última coletiva de imprensa sobre a ligação com o Brasil e com os países que fazem parte do bloco econômico BRICS.

Durante a coletiva de imprensa no dia da posse, Trump respondeu à pergunta da jornalista Raquel Krahenbuhl, da TV Globo, que questionou o presidente sobre a relação da América Latina e o Brasil. “Eles precisam de nós muito mais do que nós precisamos deles. Todos precisam de nós” respondeu o Donald Trump sobre a relação comercial com o Brasil. Trump ainda acrescentou que “como uma nação BRICS sim, vai ter 100% de tarifa se eles fizerem o que estão pensando fazer”.

Na resposta, Trump fez menção à discussão sobre a substituição do dólar como moeda comercial comum entre Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul e os demais que ingressaram no cooperativo comercial, o BRICS. No início deste ano, Lula assumiu a presidência do grupo em uma liderança rotativa e, desde a tentativa da mudança da moeda, demonstrou-se grande entusiasta da ideia. Apesar disso, a relação com o atual presidente americano pode ficar mais tensa após as ameaças de Trump caso a moeda seja adotada.

É importante considerar que mesmo dentro do contexto da criação da nova moeda, não há um consenso sobre a medida entre os países membros do BRICS. Apesar de alguns países, como o Brasil e a Rússia, se posicionarem a favor da medida, ainda não foi decidido se a medida entrará em vigor.

Redes sociais

Não somente as tarifas, a rede social TikTok também sofreu restrições dentro do território norte-americano, mostrando que a constituição dos Estados Unidos prevaleceu em cima dos interesses da plataforma. Confirmada na sexta-feira (17), a lei estabelecida na Suprema Corte condicionou o aplicativo a vender parte do seu serviço para uma empresa americana para continuar em atividade. Depois de ficar fora do ar por menos de 24 horas, um prazo maior de 90 dias foi estipulado para que o TikTok encontrasse um parceiro que pudesse obter 50% das ações do aplicativo.

“Ao fazer isso, salvamos o TikTok, mantemos ele em boas mãos e permitimos que continue operando. Sem a aprovação dos EUA, não há TikTok. Com a nossa aprovação, ele vale centenas de bilhões de dólares – talvez trilhões”, disse o presidente sob a justificativa que a medida seria eficaz para resguardo da segurança nacional e do monitoramento de dados.

O Trump

Desde sua primeira temporada, o governo Trump demonstrou sua condução autoritária para todas as propostas feitas em campanhas. O aumento de políticas rígidas anti-imigratórias, a alta influência na produção nacional, o negacionismo climático, a dificuldade nas comercializações internacionais e a interferência em conflitos ao redor do mundo são ações que não surpreendem quem já conhece os movimentos do republicano dono de uma das maiores campanhas americanas.

Apesar de parecer destemido e ter diversas polêmicas cercando suas políticas, Donald Trump não é uma singularidade nos Estados Unidos. A vitória do republicano era prevista e, em meio ao fortalecimento da direita em âmbito internacional. A eleição do presidente apenas evidencia a polarização global e o ressurgimento do extremismo nas posições de liderança das Nações.

Foto oficial da Casa Branca por Shealah Craighead
Foto da capa: por DodgertonSkillhause em Morguefile.com
Editado por Lucas Cardamone e Lucas Gines

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