Gramado artificial X Gramado natural: qual é o melhor para o futebol moderno?
Avanços tecnológicos, economia, performance e saúde dos atletas estão no centro do debate sobre o futuro dos campos de futebol
Por Sophia Delcor e Larissa Bonifácio
Nos últimos anos, o futebol moderno tem passado por diversas transformações, dentro e fora das quatro linhas. Uma das mais visíveis e polêmicas é a substituição de gramados naturais por sintéticos em estádios de alto nível. Por um lado, clubes de futebol que buscam reduzir custos de manutenção dos gramados naturais e garantir a qualidade uniforme dos campos durante toda a temporada. Pelo outro, jogadores que apontam riscos de mais lesões no sintético e mudança na dinâmica do jogo e velocidade da bola. Afinal, qual é o melhor tipo de gramado para o futebol do século XXI?
No Brasil, a discussão se intensificou quando o Palmeiras, Atlético Paranaense e, mais recentemente, o Botafogo, adotaram gramados artificiais em seus estádios. A promessa: menos gastos com irrigação e corte, maior resistência em climas extremos e menos adiamentos de partidas por causa da chuva. Mas essa modernização tem seus críticos, principalmente entre os próprios atletas.
Performance em jogo
Para alguns jogadores, a mudança de piso impacta diretamente na performance. O gramado artificial costuma ser mais duro, o que altera o quique da bola e o tempo de reação.
Henrique Kastchuk, goleiro da base do Palmeiras, aponta que em sua visão, existem benefícios e malefícios nos dois tipos de gramado, “Acho que todos os atletas concordam que jogar em um campo natural é muito melhor que jogar em gramado artificial, porém, o gramado sintético é uma melhor opção se for comparado com um campo natural ‘ruim’, desgastado, ou com buracos” e diz que isso é muito comum no futebol brasileiro.
Ele completa dizendo que o gramado artificial chegou para melhorar as condições de jogo para clubes que não conseguiam cuidar tão bem do seu gramado natural. “Além disso, o gramado artificial já se tornou uma rotina na base do futebol brasileiro, então não temos mais como dar ‘desculpas’ de que o gramado artificial teve culpa por um mau futebol apresentado” acrescentou o jogador.

Jogador da base do Palmeiras Henrique Kastchuk – Reprodução: @henrique.kastchuk
Outro atleta da base palmeirense, Gabriel Pereira, volante e meia do sub-20, também compartilhou sua experiência: “Eu jogo em um clube onde utilizamos o gramado sintético em quase 80% das atividades, então já estou bastante acostumado. São gramados de boa qualidade, que permitem a prática do futebol em alto nível, como, por exemplo, a Arena Barueri, onde mandamos nossos jogos.”
Para ele, o gramado sintético é um campo mais rápido e leve, o que exige adaptação e treinamentos específicos. O jogador, que já passou por sintéticos onde a bola ficava muito “viva” ou onde o campo era muito duro e atrapalhavam seus passes, conta que tudo depende da qualidade do gramado. Pereira complementou afirmando que no Palmeiras utilizam grama sintética de altíssima qualidade, então não vê motivos para reclamar nesse sentido.
Segundo Gabriel, apesar da boa estrutura do clube, ainda há uma preferência pessoal. Ele ressalta, “Particularmente, prefiro jogar em gramado natural, desde que seja de boa qualidade. Me sinto mais seguro, especialmente em relação ao impacto nas articulações e no tipo de movimento que o campo permite. Infelizmente, no Brasil, poucos clubes investem como deveriam na manutenção dos campos naturais. Basta olharmos para as principais ligas do futebol mundial, onde praticamente não vemos grama sintética.”

Jogador sub-20 do Palmeiras Gabriel Pereira – Reprodução: @gabrielrichvicki_
Custo e sustentabilidade
Do ponto de vista econômico e ambiental, o gramado sintético leva vantagem. Sua manutenção exige menos água, produtos químicos e trabalho humano. Em países de clima extremo, como Canadá e Rússia, ele já é predominante há anos. No Brasil, onde o verão pode castigar gramados naturais, o sintético tem sido uma solução viável.
Por outro lado, especialistas em sustentabilidade alertam para o impacto ambiental do material sintético, feito em sua maioria de plástico e borracha reciclada. Ao fim da vida útil, o descarte ainda representa um desafio.

Gramado sintético do Allianz Parque – Reprodução: TNT Sports Brasil
CBF e FIFA: há regras?
A CBF permite o uso de gramados sintéticos desde que aprovados em testes de qualidade. Já a FIFA tem um selo chamado “FIFA Quality Pro”, exigido para partidas oficiais internacionais em campos artificiais. No entanto, há ainda um estigma cultural: muitos torcedores e comentaristas associam o sintético a um jogo “menos tradicional”, enquanto o natural ainda é visto como símbolo do futebol raiz.
Lesões nos dois tipos de gramado
A ex-Médica do Corinthians, Ana Carolina Côrte, em rede social, contou sua opinião sobre o gramado artificial e citou a pesquisa realizada pela UEFA sobre lesões nos gramados: “A gente não tem muitas conclusões, mas existe um estudo que eu gosto de falar, feito pela Uefa durante 18 anos, com clubes europeus, que aborda como diminuir o número de lesões no futebol. Uma das discussões foi: que tipo de lesão se tem no gramado sintético e na grama natural? O que a gente sabe é que o número de lesões não muda muito entre o sintético e o natural, mas o que muda é a diferença das lesões. No gramado natural, ocorrem muito mais lesões musculares, que é o que a gente vê no nosso dia a dia mesmo. Já no gramado sintético, há a prevalência de lesões ligamentares, de joelho e de tornozelo”, concluiu Ana.
Afinal, qual é a melhor opção de gramado?
A resposta talvez não seja absoluta. Para clubes com alta demanda de uso do estádio, como shows e jogos consecutivos, o sintético é uma alternativa prática e moderna. Para centros de treinamento, pode evitar o desgaste diário. Já para partidas de alto rendimento técnico, o natural ainda oferece melhor resposta física e conforto para os atletas.
Para Henrique Kastchuk, mesmo com todos esses fatores que contribuem com a escolha do gramado artificial, ele afirma: “Para a maioria dos jogadores, o gramado natural é muito melhor de se jogar quando está em boas condições”.
O futebol moderno exige um equilíbrio entre tradição e inovação, e o debate sobre os gramados é apenas um exemplo de como o esporte está em constante adaptação. Seja em solo natural ou em tapete sintético, o importante é manter a bola rolando, com segurança, qualidade e espetáculo.